domingo, 9 de maio de 2021

Sobre o lado B da maternidade

 

Hoje é Dia das Mães e nossos feeds estão repletos de fotos e homenagens às mães e figuras maternas importantes nas vidas de nossos amigos. Eu mesma postei, no perfil pessoal, uma foto em família para simbolizar a data. Adoro mamãe: nós nos damos super bem e devo muito a ela, que me criou com amor, respeito e diálogo. Mas essa é a parte bonitinha da qual nos orgulhamos de falar. E vocês já devem saber que eu sou “fogo no parquinho”. Então, não poderia deixar de lembrar o lado B da maternidade.

Um dos meus livros preferidos, senão o preferido, é “Precisamos Falar sobre o Kevin”, da autora americana Lionel Shriver. Há também uma ótima adaptação cinematográfica com a camaleônica Tilda Swinton no papel principal. Nessa história, Eva, que a princípio não deseja ser mãe, vive seu inferno pessoal após dar à luz Kevin, um garoto problemático desde a infância. A relação que se estabelece entre mãe e filho é de tensão: ele recusa seu peito para mamar, chora sem parar quando bebê, destrói seu escritório quando criança, passa vírus para seu computador de trabalho quando adolescente, até que, no grand finale, provoca uma chacina em sua escola, matando colegas e funcionários. Isso mesmo: Kevin é um garoto Columbine. E Eva é forçada a olhar para trás, tentando buscar pistas no passado de que havia algo muito errado na personalidade do filho. Ela se pergunta qual o seu grau de culpa nas atitudes dele. Seria possível ter evitado a tragédia?

Em “O Acerto de Contas de uma Mãe”, Sue Klebold, a mãe real de um garoto Columbine, se faz a mesma pergunta. Ela considera que o filho teve uma criação completamente normal e amorosa, tenta nos mostrar isso e compartilha sua dor ao perdê-lo em circunstâncias tão trágicas. Não se sabe o que é mais assustador: a ficção ou a realidade. Se “ser mãe é padecer no paraíso”, imagina o custo pra essas mães.

Cabe aqui lembrarmos que a maternidade é linda, mas nem um pouco glamourosa. Envolve uma enorme dose de responsabilidade. Especialmente em uma sociedade patriarcal que culpa a mulher por qualquer erro. É engraçado quando rimos dos clichês com personagens como Dona Hermínia (que Deus o tenha, nosso querido Paulo Gustavo). É trágico quando tentamos empatizar com mães de assassinos e suicidas. Mas, certamente, não é brincadeira.

Só pra citar um último exemplo literário: em “A Filha Perdida”, a italiana Elena Ferrante retrata um caso de abandono. Porém, aonde quer que vá, a mãe-protagonista se sente perseguida por suas crias, não consegue cortar o vínculo dentro de si, por maior que seja sua fadiga mental. Podemos julgar essa mulher? Pelo menos não devemos, porque não sabemos o custo emocional que esse gesto teve para ela.

Conclusão: valorizem suas mães, mas não exijam demais delas, pois são seres humanos falhos e frágeis às vezes. E, para as mães de plantão que possam estar me lendo, sejam mães possíveis e não se cobrem tanto. Vocês também precisam ser cuidadas.

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