terça-feira, 19 de novembro de 2024

Resenha - O avesso da pele (Jefferson Tenório)

 

Hoje é o Dia da Consciência Negra e nada melhor do que resenhar um livro vencedor do Jabuti com protagonistas negros. Em O avesso da pele, Jefferson Tenório constrói um narrador que usa a segunda pessoa do singular, dirigindo-se ao pai já falecido. Pedro, o narrador, reconstitui a história de seus pais, a partir do que sabe, ouviu falar ou imaginou, como o próprio confessa. Uma história marcada por preconceito, pobreza, sofrimento e alguma alegria, escondida no fundo.

Os pais descobrem, desde muito cedo, o peso social de sua cor de pele. Vale a pena enumerar algumas situações de racismo: o pai é confundido com um bandido, discriminado em uma entrevista de emprego, vítima de piadas racistas da família de uma namorada branca e abordado diversas vezes por policiais sem motivo; a mãe é vítima de violência doméstica com seu primeiro marido, cuja família também a discrimina.

No romance de Jefferson Tenório, o racismo é escancarado, e revolta, mas infelizmente não surpreende, pois trata-se de situações corriqueiras que vemos todos os dias nos jornais e nas ruas. Tudo isso numa linguagem simples, tom poético e abordagem sensível, que leva em conta os sentimentos dos personagens, suas dores e seus prazeres.

O livro chegou a ser censurado numa escola, ainda esse ano, o que nos mostra o quanto ainda temos que avançar em certos debates. Deveria ser leitura obrigatória.

Finalizo a resenha com um trecho que explica o título, uma fala do pai do narrador:

É necessário preservar o avesso, você me disse. Preservar aquilo que ninguém vê. Porque não demora muito e a cor da pele atravessa nosso corpo e determina nosso modo de estar no mundo. E por mais que sua vida seja medida pela cor, por mais que suas atitudes e modos de viver estejam sob esse domínio, você, de alguma forma, tem de preservar algo que não se encaixa nisso, entende? Pois entre músculos, órgãos e veias existe um lugar só seu, isolado e único. E é nesse lugar que estão os afetos. E são esses afetos que nos mantêm vivos.”

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