sexta-feira, 28 de outubro de 2022

Meu lado psicopata (trecho de Dançando na Varanda)


Existem dois aspectos que formam a base da minha personalidade: meu lado Disney e meu lado psicopata.

[...]

Será que “lute como um psicopata” soaria muito pesado? Não me entenda mal, só quero entender o mal. E esse meu fascínio deve ter começado com as vilãs. Bem maniqueísta, eu sei, mas vilões são com frequência muito mais interessantes que os mocinhos. Porque eles têm uma liberdade maior de ação. E são poderosos, têm estilo, charme, elegância, na maior parte das vezes. Outro fator que me introduziu a essa “vida de crime” (apenas na ficção, é claro) foi a literatura policial, que comecei a procurar no início da adolescência. Em geral, iniciamos com Agatha Christie e passamos aos poucos pra drogas mais pesadas: o Sherlock de Conan Doyle, o Dupin de Edgar Allan Poe, Raymond Chandler, Luiz Alfredo Garcia-Roza e Raphael Montes pra valorizar os nacionais, e, quando você vê, já está lendo Hannibal e vendo os filmes com o Anthony Hopkins como se fosse Sessão da Tarde. Mas, veja bem, nunca houve uma passagem, uma ruptura dos filmes da Disney pra Hannibal, são coisas que se misturam na criação de uma personalidade humana mais completa e complexa. Vai dizer que você nunca parou pra observar suas esquisitices e contradições? Senão, devia. É um exercício muito bom.

Mas o que é tão fascinante nos psicopatas? Há vários elementos que podemos considerar: entre uma atração pelo perigo e pelo proibido, a liberdade de ultrapassar fronteiras socialmente estabelecidas e a glamourização dos próprios personagens assassinos pela mídia, eu destacaria a capacidade de tacar o foda-se pro que todo mundo diz e exige de você. Psicopatas não se importam. Eles não têm sentimentos empáticos, não são capazes de se conectar emocionalmente com alguém. E isso lhes dá um grande poder. Porque nada pode feri-los. Eles não têm o coração partido. Claro, assim também perdem o lado mais bonito das relações: a troca, o afeto, o acolhimento e o aprendizado. Em contrapartida, não precisam lidar com a frustração. Ou lidam com ela cortando cabeças. Deve ser terapêutico.

(Dançando na Varanda - Nicole Ayres)

Nenhum comentário:

Postar um comentário